A literatura é uma poderosa ferramenta para refletir sobre diferentes realidades, conectar culturas e ampliar nossa visão de mundo. Em um cenário onde a literatura europeia muitas vezes ocupa o centro das atenções, é essencial descentralizar nosso olhar e reconhecer outras formas de narrativas e tradições literárias. Essa mudança é um passo fundamental para quebrar os processos de colonização cultural que moldaram a forma como consumimos conteúdo. Ao ampliar nossas referências literárias, não apenas diversificamos nossas leituras, mas também valorizamos as múltiplas vozes que enriquecem a história da humanidade.
Nesta seleção, reunimos 10 livros que exploram temas como racismo, liberdade, maternidade, amor e lutas por justiça social. Com histórias que atravessam continentes, gêneros literários e gerações, essas obras são um convite para mergulhar em universos únicos.
1. "Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada" – Carolina Maria de Jesus
Neste diário, Carolina Maria de Jesus narra sua vida como catadora de papel em uma favela nos anos 1950. A linguagem simples, mas contundente, comove o leitor pelo realismo e pelo olhar sensível na hora de contar o que viu, viveu e sentiu nos anos em que morou na comunidade do Canindé, em São Paulo, com três filhos. Com uma escrita poderosa e comovente, expõe as dificuldades da pobreza, o racismo e a luta diária pela sobrevivência.
2. "Torto Arado" – Itamar Vieira Junior
Um texto épico e lírico, realista e mágico que revela, para além de sua trama, um poderoso elemento de insubordinação social. Vencedor do prêmio Leya 2018.
A obra acompanha a vida de duas irmãs, Bibiana e Belonísia, no sertão baiano. Ao longo de gerações, elas enfrentam o peso da escravidão moderna e as desigualdades sociais em uma narrativa profundamente poética e envolvente.
3. "Olhos d'Água" – Conceição Evaristo
Esta coletânea de contos aborda temas como racismo, desigualdade e ancestralidade por meio de histórias de pessoas marginalizadas, trazendo à tona a luta, a dor e a força de personagens complexos.
Em Olhos d’água estão presentes mães, muitas mães. E também filhas, avós, amantes, homens e mulheres – todos evocados em seus vínculos e dilemas sociais, sexuais, existenciais, numa pluralidade e vulnerabilidade que constituem a humana condição. Sem quaisquer idealizações, são aqui recriadas com firmeza e talento as duras condições enfrentadas pela comunidade afro-brasileira.
4. "Americanah" – Chimamanda Ngozi Adichie
O romance narra a vida de Ifemelu, uma jovem nigeriana que se muda para os EUA e enfrenta questões de identidade racial e cultural enquanto tenta se ajustar à nova realidade, sem esquecer de suas raízes.
Quinze anos mais tarde, Ifemelu é uma blogueira aclamada nos Estados Unidos, mas o tempo e o sucesso não atenuaram o apego à sua terra natal, tampouco anularam sua ligação com Obinze. Quando ela volta para a Nigéria, terá de encontrar seu lugar num país muito diferente do que deixou e na vida de seu companheiro de adolescência.
5. "Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola" – Maya Angelou
Autobiografia poética e impactante que narra a infância e juventude de Maya Angelou, abordando temas como racismo, abuso e libertação. É uma história de resiliência e descoberta pessoal.
As lembranças dolorosas e as descobertas de Angelou estão contidas e eternizadas nas páginas desta obra densa e necessária, dando voz aos jovens que um dia foram, assim como ela, fadados a uma vida dura e cheia de preconceitos. Com uma escrita poética e poderosa, a obra toca, emociona e transforma profundamente o espírito e o pensamento de quem a lê.
6. "O Mundo Se Despedaça" – Chinua Achebe
O romance O Mundo Se Despedaça, de Chinua Achebe, narra a história de Okonkwo, um guerreiro da etnia ibo no sudeste da Nigéria, durante a desintegração da vida tribal causada pela chegada dos colonizadores britânicos. Com a introdução do cristianismo, de novas instituições como escolas, leis e a polícia, os valores e tradições do clã são profundamente abalados.
A obra retrata o impacto cultural e social do colonialismo, sendo considerada um marco da literatura africana moderna. Publicado em 1958, antes da independência da Nigéria, o livro destaca o ponto de vista interno e genuíno de uma cultura em transformação.
7. "Tudo Sobre o Amor" – Bell Hooks
Neste livro profundo e acessível, Bell Hooks explora a importância do amor como uma força transformadora. Ela reflete sobre como amar de maneira autêntica e radical pode curar feridas pessoais e coletivas, enfrentando questões como sexismo, racismo e desamor em uma sociedade contemporânea.
Na contramão do pensamento corrente, que tantas vezes entende o amor como sinal de fraqueza e irracionalidade, Bell Hooks defende que o amor é mais do que um sentimento - é uma ação capaz de transformar o niilismo, a ganância e a obsessão pelo poder que dominam nossa cultura.
8. "Amada" – Toni Morrison
Vencedor do Prêmio Pulitzer, este romance poderoso narra a história de Sethe, uma mulher ex-escravizada que vive assombrada pelo fantasma de sua filha. Situado no período pós-Guerra Civil dos EUA, o livro explora traumas geracionais, a maternidade e a luta pela liberdade.
Amada segue uma estrutura não-linear, viaja do presente ao passado, alterna pontos de vista e sonda cada uma das facetas desta história sombria e complexa. Considerado um clássico contemporâneo, este livro faz um retrato ao mesmo tempo lírico e cruel da condição do negro no fim do século XIX nos Estados Unidos.
9. "Mulher, Raça e Classe" – Angela Davis
Neste clássico, Angela Davis analisa como as opressões de gênero, raça e classe se entrelaçam na sociedade. O livro discute a história do feminismo, abolicionismo e movimentos pelos direitos civis, trazendo uma perspectiva interseccional crucial.
Além de questionar o sistema carcerário e as relações de poder, Davis reflete sobre representatividade, destacando sua importância, mas também seus limites. Para ela, ocupar espaços de poder só faz sentido quando há compromisso em romper com lógicas opressoras.
10. "Notas de um Filho Nativo" – James Baldwin
James Baldwin, aos 31 anos, se dá conta do momento mais importante de sua formação, quando se viu obrigado a perceber que a linha do seu passado não levava à Europa, e sim à África. Foi então que ele se deparou com uma revelação chocante: Shakespeare, Bach e Rembrandt não eram criações “realmente minhas, não abrigavam minha história; seria inútil procurar nelas algum reflexo de mim. Eu era um intruso; aquele legado não era meu”. Uma coleção de ensaios em que Baldwin reflete sobre raça, identidade e a experiência de ser negro nos Estados Unidos. Com uma prosa incisiva e emotiva, ele aborda temas como discriminação, cultura e os desafios enfrentados pela comunidade negra.
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